SOBRE MARTIN LUTHER KING JR.
O
Consulado Geral dos Estados Unidos, no Rio de Janeiro, promoveu, no dia 24 de
fevereiro de 2015, uma videoconferência sobre o reverendo, detentor do Prêmio
Nobel da Paz, Doutor Martin Luther King Jr. Era mais um lançamento, também, da
obra do Doutor Clayborne Carson, curador de documentos do pacifista, líder de
movimentos pelos direitos civis em seu país, traduzida para o Português pelo
Professor Carlos Alberto Medeiros. O livro, numa edição da Zahar, está disponível
nas livrarias.
Quem desejar assistir à videoconferência basta
usar um dos links a seguir, um em Português
( https://www.youtube.com/watch?v=ab62MZqVi54) e o
outro em Inglês: (https://www.youtube.com/watch?v=MCvzZrHpYBo)
EM 1964, PRÊMIO NOBEL DA PAZ
O artigo a seguir, de Martin Luther
King, na opinião de estudiosos de sua vida e obra, ao revelar sua estratégia de
ação pós Prêmio Nobel[1] – enfrentar a máquina de guerra de
seu país – teria sido a verdadeira razão de seu assassinato.
Escreveu: Dr. Martin Luther King Jr[2].
O Prêmio Nobel da Paz é
uma grande honra, mas não bastante para
que iniciemos um “período de satisfação” no movimento dos direitos civis.
Retornamos
de Oslo não com nossas cabeças nas nuvens, nos parabenizando por notáveis dias
do passado e tentados a declarar uma pausa em nossa luta. Voltamos com nossos
pés ainda mais firmemente assentados no solo; convicções robustecidas e metas
conduzidas por aspirações de grandiosos e brilhantes amanhãs.
Em
aceitando o Prêmio Nobel da Paz de 1964, indaguei por que tal honraria recaiu
sobre um movimento que se mantém assediado mas
comprometido a uma luta sem trégua; a um movimento que é um crescente
avançar com majestoso escárnio para com o risco e o perigo; a um movimento que
não venceu a essência da paz e da humanidade que são a essência do grande
legado do conde Alfred Nobel.
Sugeri,
então, e mantenho como firme convicção, que o Prêmio fosse outorgado não apenas
como reconhecimento às conquistas do passado, mas como galardão – a mais
profunda recompensa – de que o modo não violento, esse método dos negros
norte-americanos, é o caminho para a crucial questão política e moral de nossos
tempos: a necessidade de o ser humano superar a opressão e a violência, sem se
valer da violência e da opressão.
Em
praticamente todas as entrevistas de imprensa desde meu retorno de Oslo surgem
estas questões: E agora? Qual o rumo que seguirá o movimento pelos direitos
civis?
Não
posso falar por todo o movimento dos direitos civis. Muitos são os comandantes;
sou apenas um deles, e a organização que presido, a Southern Christian Leadership Conference – SCLC (Conferência
Sulista de Liderança Cristã), é, em essência, uma entidade sulista buscando
soluções para problemas típicos do Sul.
Todavia,
devemos ser realistas. Desde o instante em que foi anunciado que o Parlamento
da Noruega me havia escolhido como vencedor do Prêmio Nobel da Paz de 1964,
solicitações para meu envolvimento tanto em questões nacionais como
internacionais começaram a pipocar.
Assim, embora eu vá continuar a dar prioridade para os problemas do Sul, compreendo
que deverei, mais e mais, estender meu trabalho para além de suas fronteiras.
Em
verdade, já comecei a assim agir. Na viagem para Oslo tive a oportunidade de discutir
questões raciais com o Lorde Chanceler Britânico, bem como com membros do
Parlamento inglês. Também participei da organização de um movimento para unir
as pessoas de cor residentes em Londres e seu entorno. E inclui caribenhos,
paquistaneses, indianos e africanos que, juntos, lutam contra injustiças
raciais na Inglaterra.
Em
casa, pressões se intensificam para que a SCLC abra sucursais em várias cidades
do Norte. Chegaremos a uma decisão sobre este ponto após uma excursão, nesta
primavera, do projeto Empregos e Circuito
da Liberdade, a 10 cidades nortistas consideradas como relevantes.
Entendemos que muitos dos problemas raciais no Norte existem por causa do Sul –
como resultado de anos de pobreza que foram levados junto com os inúmeros
sulistas que migraram para o Norte, desde a Segunda Guerra Mundial.
Assim,
embora que a base operacional principal da SCLC
venha a ser mantida no Sul, onde podemos atacar
Noutro
nível, devo emprestar especial atenção a três problemas que considero os
maiores que desafiam a humanidade: injustiça racial em todo o planeta, pobreza
e guerra.
Embora
que cada um aparente estar separado e isolado, se interligam num único tecido:
o destino da humanidade.
Examinemos
a injustiça racial ao redor do mundo. A luta para eliminar esse mal se
constitui num dos maiores desafios destes tempos. A mais, o que está ocorrendo
nos Estados Unidos quanto a isso é relativamente uma pequena parte da revolta
universal à injustiça racial. Por todo o mundo, qual uma febre, os movimentos
de libertação se espalham como nunca na história. Multidões em toda parte
mostram-se determinadas a pôr um fim na exploração de raças e terras. Eles
despertam. Movimentam-se. E o negro norte-americano viu-se apanhado no Zeitgeist[3].
Também se movem, com seus irmãos negros da África; com seus irmãos marrons e
amarelos da Ásia, América do Sul e Caribe.
“Não-violência”,
é a palavra que caracteriza alma e corpo da batalha do negro norte-americano
contra a injustiça racial. De maneira ampla, ela significa que aqueles
engajados no movimento de direitos civis não se apóiam em armas e munições de
guerra. Ao contrário, eles têm esmagado o mal por meio de não cooperar com leis
e costumes que são a face institucional do regime de escravidão e
discriminação. Muitos na luta têm sido brutalizados. Alguns morreram. Mas em
tempo qualquer buscaram infligir brutalidade aos seus opressores. Buscam apenas
libertar a sociedade americana e ter parte na autolibertação de todos os povos
americanos.
Deparo-me
pensando, cada vez mais frequentemente, no que considero como o segundo maior
mal da humanidade: o mal da pobreza. É um mal que existe tanto em Indiana como
na Índia; em Nova Orleans ou
Não
poderíamos acordar que o momento tenha chegado para uma total guerra contra a
pobreza; não, apenas, para a “Grande Sociedade”, do presidente Johnson, mas
para todo e qualquer recanto do mundo onde esse renitente mal existe? Pobreza,
especialmente essa disseminada entre 35 milhões de pessoas nos Estados Unidos,
tem por base não a falta de recursos, mas num trágico déficit de solidariedade.
Fica a impressão de que eliminamos os pobres de nossas cogitações e os
retiramos do foco de nossa sociedade. Fizemos com que os pobres se tornassem
invisíveis e externamos nosso desagrado quando sua presença é notada. Todavia,
assim como a não-violência mostrou o horror da injustiça racial, devemos
encontrar meios de expor e curar a doença da pobreza – não apenas em seus
sintomas, mas em suas causas essenciais.
O
terceiro grande mal a desafiar a humanidade é algo com o que me considero
profundamente interessado. É o mal da guerra. A China Vermelha recentemente
juntou-se à comunidade nuclear, alertando claramente que as nações não estão
reduzindo, senão que aumentando seus arsenais e destruição
Em
Oslo eu sugeri que a filosofia e estratégia da não-violência viesse a se tornar
imediatamente objeto de estudo e séria experiência em todos os campos do
conflito humano, inclusive nas relações entre as nações. Não era, creio, uma
sugestão fora da realidade. A paz mundial através de meios não violentos não é
nem um absurdo, tampouco o inalcançável. Todos os outros métodos falharam.
Assim, devemos iniciar algo de novo. Não-violência é um bom ponto de partida.
Aqueles dentre nós que acreditam nesse método podem ser as vozes da razão,
sanidade e compreensão, em meio às vozes da violência, ódio e paixão. Podemos
muito bem impor um ambiente de concórdia, a partir do qual um sistema de paz poderá ser construído.
Injustiça
racial por todo o mundo. Pobreza. Guerra. Quando a humanidade resolver esses
três problemas terá nivelado seu progresso moral ao seu desenvolvimento
científico. E o que é mais importante: terá aprendido a prática arte do viver
em harmonia.
O
Prêmio Nobel deu-me uma ainda mais profunda fé de que a humanidade muito breve
encontrará o momento, quando dará um novo rumo a seu tempo, se direcionando
rapidamente para seu destino.
UMA OPINIÃO AO TEMPO
“Nos
últimos dois anos, à medida em que me enderecei para a revelação de meus
silêncios e falar a partir das ardências de meu coração – como me pronunciei
pela nossa radical saída do Vietnam – muitas pessoas me questionaram quanto à
sapiência do caminho seguido. Do âmago de minhas preocupações esse desafio tem
comumente assomado grande e ruidosamente: “Por que estás falando de guerra, Dr.
King? Por que te somas às vozes do dissenso?” “Paz e direitos civis não se
misturam”, dizem. “Não estás agredindo a causa de teu povo? me indagam. E
quando os ouço, embora compreenda a fonte de suas preocupações, me sinto
todavia entristecido, posto que tais questões significam que os que indagam em
verdade não me conhecem, desconhecem meu compromisso, minha vocação”.
O discurso ante à Academia, ao receber o
Prêmio, pode ser visto e ouvido no link, ,
http://www.ebony.com/news-views/mlks-nobel-prize-at-50-implications-for-ferguson-beyond-500#axzz3TZf6uNlG